O Buraco Negro da Paparoca aos Fins de Semana

O Buraco Negro da Paparoca aos Fins de Semana

O ser humano precisa de se alimentar para subsistir. Penso que esta é uma afirmação consensual e universal, mas nos dias de hoje uma pessoa nunca tem bem a certeza, tamanha é a volatilidade da malta que por aqui anda (e que também anda por aí, não fique já empolgado com uma hipotética exclusividade de andamento com preferência regional, caro leitor). Porém, divago e disperso. Voltemos ao cerne da questão da paparoca.

Ao longo da semana, encontro-me numa espécie de transe, constantemente envolvido pela rotina. Acrescento ainda que, quase que por magia, chegam as horas de abrir a goela e afagar o estômago com comidinha e a tal paparoca está sempre lá. Seja porque eu a preparei, seja porque eu a comprei, seja porque eu a fanei ou até mesmo porque chateei alguém para fazer as duas primeiras coisas que mencionei (macho que é macho fana independentemente, não precisa de delegar o processo de fanar para terceiros).

Isto é lindo, mas acaba por desabar aos fins de semana. Ao que parece, a utopia palpável que experiencio ao longo dos dias úteis mergulha numa espécie de antro de anarquia gastronómica ao Sábado e ao Domingo (surgiram-me aqui duas questões de pertinência dúbia; será que o facto de não existir consistência ao nível de confeção de refeições ao Sábado e ao Domingo reforça o facto destes dias não serem considerados úteis? E ainda, com o novo acordo ortográfico (que tecnicamente já é meio velho) será que “Sábado” e “Domingo” se escrevem com maiúscula?) (Já agora, achei giro usar parêntesis dentro de parêntesis (citando uma grande filósofa contemporânea, “Oops, I did it again”)).

Deambulo de novo, peço perdão e encarno um boomerang, porque fui e voltei. Nos fins de semana, tudo aparenta estar a correr de maneira semelhante aos referidos dias úteis até que é a horinha de jantar. Aqui existe uma enorme despreocupação e atrever-me-ia a chamar-lhe um severo caso de ‘preguicite geral’ ou, em bom português, uma espécie de ‘deixa para lá’.

Se o agregado familiar estiver todo em casa para a altura de jantar, todos fingem que estão super híper mega ocupados, numa tentativa inglória de não terem de ser eles a tratar de materializar uma solução para os barulhos bovinos que saem das respetivas barriguinhas. A mãe decide ordenar cronologicamente as fotos do ambiente de trabalho do seu PC, o pai arranja a monocelha com cera e o irmão entra rapidamente na fase de fechar a porta do seu quarto com violência digna de puto estúpido.

Ora, a questão é, o que é que eu faço no meio disto? A lógica dita que eu estivesse a fazer o jantar, mas não. Eu lanço a seguinte posta de pescada: ‘Como é com o jantar, malta?’ e, face a um silêncio ensurdecedor como resposta, deduzo que o jantar será jejum fresco. Não conformado, escrevo esta crónica como enorme indireta, pois quero jogar também a este braço de ferro irrelevante e inconsequente. Só para terem noção, o meu pequeno almoço de hoje é, na realidade, o jantar de ontem porque se arrastou tanto que nem comi.

(Nota: Recomenda-se a leitura deste texto ao Domingo ou à Segunda, para a brincadeira final funcionar)